Análise

A incidência das contribuições previdenciárias sobre os recebimentos decorrentes de stock options

Por Nadia Salay e Daniel Gustavo Yamamoto, sócios da área de Consultoria Tributária da Deloitte; Isabelle Dassier, sócia da área de Audit & Assurance da Deloitte; e Thiago Lima, gerente de Audit & Assurance da Deloitte.

Nos últimos anos, tem sido ampliada a discussão sobre criação de valor na concepção dos stakeholders, o que evidencia a importância de realizar uma avaliação de desempenho de longo prazo sob a perspectiva da gestão econômico-financeira.

Neste cenário cada vez mais globalizado e competitivo, as empresas tiveram que buscar novos mecanismos em prol de melhores resultados, considerando, por exemplo, a relação de impactos positivos das ações ESG (ambiental, social e governança).

Vale ressaltar que o social não considera apenas a perspectiva da relação da empresa com a sociedade, mas também as relações internas da empresa, refletindo, consequentemente, sobre a governança. Faz parte das boas práticas a retenção de talentos de forma responsável, tanto internamente quanto externamente.

Por isso é relevante criar políticas de participação dos trabalhadores (beneficiários) na empresa, dentro das quais estão os planos de stock options.

Embora o termo seja bastante utilizado para se referir ao direito do beneficiário de exercer opção de compra de ações, outros modelos de planos possuem características distintas que usualmente não possuem opção de compra, como as ações restritas (restricted shares) e as ações fantasmas (phantom shares).

Os planos de incentivos de longo prazo (ILP) visam melhor alinhamento entre empresa e beneficiário para criação de valor de forma sustentável; a longo prazo, atraem, retêm e motivam seus beneficiários e, muitas vezes, podem ser utilizados com o objetivo de assegurar a aderência das ações da governança com o propósito da entidade e interesse de seus stakeholders, como é o caso, por exemplo, de métricas de remuneração atreladas à ESG.

Antes de implementar qualquer modelo de plano de ILP, as empresas devem avaliar as práticas de mercado, os aspectos legais aplicáveis à estrutura de capital (se aberto ou fechado), o capital disponível para diluição e os incentivos que desejam criar – bem como os aspectos contábeis e, principalmente, tributários sobre estes planos. Em relação aos aspectos tributários, a questão a ser respondida é se deve ou não incorrer sobre as stock options encargos previdenciários e trabalhistas como parte da remuneração.

Remuneratória ou mercantil

No Brasil, atualmente, a Lei 12.973/14 permite às empresas deduzirem do lucro real, para fins de IRPJ e CSLL, as despesas incorridas com o exercício das stock options, correspondentes à diferença entre o valor justo das ações na data de exercício e o preço pago pelo beneficiário.

Entretanto, essa dedutibilidade é permitida somente nos casos em que a natureza remuneratória é atribuída às stock options, e desde que determinadas condições estabelecidas na legislação sejam cumpridas. A remuneração será dedutível somente depois do pagamento, quando liquidados em caixa ou outro ativo, ou depois da transferência da propriedade definitiva das ações ou opções, quando liquidados com instrumentos patrimoniais (nos termos do parágrafo primeiro do artigo 33 da Lei 12.973/14).

Nesse particular, a natureza das stock options tem se tornado o principal ponto de discussão, se remuneratória (trabalhista) ou mercantil. Os contribuintes (empresas e empregados) defendem a natureza mercantil das opções, sujeitas apenas ao Imposto de Renda sobre eventual ganho de capital apurado na venda das ações (com alíquotas que variam de 15% a 22,5%, a depender do valor do ganho de capital auferido).

Existem manifestações argumentando que as stock options, quando exercidas, representam um acréscimo patrimonial imediato ao beneficiário, independentemente de sua realização em dinheiro. Esse acréscimo é decorrente da relação de trabalho entre empregado e empresa, já que as opções são exclusivas a colaboradores e executivos e possuem privilégios maiores que os oferecidos no mercado.

Nesse caso a companhia deverá arcar com: (i) contribuição previdenciária (INSS) à alíquota de 20%; (ii) contribuição para terceiros (SENAT, SESI, SEBRAE, etc.) à alíquota de até 5,8%; (iii) contribuição SAT e RAT à alíquota de 0,5% a 6%; e (iv) eventuais encargos trabalhistas.

Os beneficiários, por sua vez, estarão submetidos ao Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), a alíquotas progressivas de até 27,5%; a responsabilidade pelo recolhimento/retenção do imposto na fonte, em nome dos beneficiários, é da companhia brasileira que efetua a concessão das stock options.

Os contribuintes, por sua vez, argumentam que o exercício das stock options implica apenas uma potencial expectativa de retorno financeiro, que dependerá da efetiva venda das ações, pois interpretam que o potencial retorno não decorre diretamente da relação de trabalho, mas sim das condições de mercado e do desenvolvimento econômico-financeiro da empresa. Além disso, defendem que as stock options não têm retorno garantido, pois estão sujeitas aos riscos de volatilidade de mercado, que a adesão ao plano é facultativa e que o exercício da opção demanda efetivo desembolso financeiro pelo beneficiário, o que as diferenciaria da remuneração em sua concepção original.

No âmbito judicial, em vários processos do Tribunal Superior do Trabalho, as stock options têm sido consideradas ativos de natureza mercantil, ou seja, apartadas do salário dos colaboradores. Essa interpretação considera tanto a onerosidade ao empregado (que deve pagar pelas ações para exercer o direito de compra) quanto os riscos associados ao mercado de renda variável.

Abaixo listamos algumas das razões que justificam a compreensão das stock options como ativos mercantis e não remuneratórios:

  • Liberdade de adesão ao plano de stock options, quando a empresa reforça a voluntariedade;
  • Onerosidade, uma vez que o beneficiário deve pagar pelas ações no momento da compra;
  • Existência de risco de mercado para o beneficiário, visto que a volatilidade da renda variável expõe as ações a flutuações de preços;
  • Inexistência de habitualidade, no caso dos planos eventuais;
  • Inexistência de metas vinculadas, demonstrando que a opção não está associada à retribuição pelo trabalho;
  • Inexistência de cláusulas de limitação de perdas, o que só confirmaria que o risco de mercado é do empregado.

Em contrapartida, há julgamentos no âmbito do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) com conclusões diferentes, defendendo a natureza remuneratória das stock options, devido às características específicas dos planos analisados nos processos, que determinavam:

  • Obrigatoriedade de adesão ao plano de stock options da empresa, que elimina a voluntariedade do beneficiário;
  • Inexistência de onerosidade na aquisição da ação, em virtude de sua gratuidade para o empregado;
  • Inexistência de risco de mercado para o empregado, que pode tanto ser derivada da falta de onerosidade quanto pela existência de alguma cláusula que retire ou mitigue o risco de quem possui uma opção de compra;
  • Habitualidade, isto é, as stock options passam a ser concedidas com frequência, como uma remuneração salarial;
  • Sujeição do empregado a metas de performance individual, o que pode demonstrar algum caráter retributivo direto do trabalho prestado pelo beneficiário;
  • Existência de cláusulas de limitação de perdas para o empregado, o que denota que o risco permanece no todo ou em parte significativa com a empresa do plano de stock options.

Planos com base em ações

Os planos de stock options consistem na outorga a um indivíduo de opções que lhes dão o direito de comprar, em uma data futura, e desde que cumpridas as condições de vesting (tempo e/ou performance), ações de uma companhia por um preço especificado ao tempo em que a opção lhe é conferida, e não ao tempo em que as ações são adquiridas.

Nesse contexto, considerando os fatores de liberdade de adesão, existência de onerosidade, existência de risco de mercado, inexistência de metas vinculadas e inexistência de habitualidade, o beneficiário poderá exercer o direito de adquirir ações após perío]do de vesting, caracterizando o plano como mercantil.

Planos de formato restricted shares consistem no recebimento de ações condicionado ao cumprimento de condições de vesting estabelecidas no momento da outorga. Ou seja, o beneficiário não recebe opções de compra de ações, como no caso do plano de stock options, mas sim ações da companhia. Usualmente, nesse modelo de plano, não há investimento pelos participantes, sendo que os ganhos são auferidos sobre o valor total das ações – e não apenas na valorização – fazendo com que exista menor risco de perda aos participantes.

Já as phantom shares consistem na outorga de “ações virtuais”, que conferem ao beneficiário o direito de receber, em uma data futura e desde que cumpridas as condições de carência, o valor referente a determinado número de ações da companhia ou à valorização de certa quantidade de ações.

Trata-se de plano similar às ações restritas e ao plano de stock options, porém, não há transferência de ações da empresa. As premiações são feitas em dinheiro com base no valor da ação (no caso de companhias listadas) ou em métricas internas de performance (na hipótese de empresas não listadas). Em regra, estas ações são concedidas gratuitamente e possuem natureza remuneratória para fins trabalhistas, previdenciários e fiscais.

Os principais desafios dos planos ILP

Independentemente do modelo de plano de incentivo de longo prazo outorgado e de qual sua classificação (mercantil ou remuneratória), os stakeholders demandam por maior clareza sobre a tributação das stock options no Brasil. Por hora, não existe um regime específico de tributação como ocorre, por exemplo, com o PLR (Programa de Participação nos Lucros e Resultados), que, por determinação legal (art. 3º da Lei nº 10.101/00), não está sujeito às contribuições previdenciárias e trabalhistas e segue um regime de tributação pelo IRPF à parte da declaração anual – embora as alíquotas sigam os mesmos patamares, ou seja alíquotas progressivas de até 27,5%.

A falta de clareza tem gerado aumento na demanda por assessorias que oferecem trabalhos de diagnósticos contábeis e fiscais. Esses diagnósticos entregam um roadmap com comentários e recomendações para implementação e operacionalização destes planos junto às áreas de negócios envolvidas (recursos humanos, controladoria, tributário, contabilidade e financeiro), tendo como principal objetivo endereçar os anseios das empresas com relação à complexidade associada à criação de novos planos e/ou de planos já existentes.

Tudo isso devidamente apresentado e divulgado nas Demonstrações Financeiras, em conformidade com a norma contábil IFRS 2/CPC 10.

Antecipar-se aos aspectos contábeis e fiscais é imprescindível para uma implementação consistente. A criação de planos de pagamentos baseados em ações sem dúvida é um mecanismo importante em prol de melhores resultados e de um crescimento sustentável a longo prazo.

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